Guia Alimentar para os Povos Guaranis: Saberes que nutrem a resistência
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Guia Alimentar para os Povos Guaranis: Saberes que nutrem a resistência

17 de Abril de 2025

Guia Alimentar para os Povos Guaranis: Saberes que nutrem a resistência

No dia em que comemoramos o Dia dos Povos Indígenas, a luta pela soberania alimentar é também uma luta por respeito às formas de existir


A alimentação é parte essencial do cuidado com a saúde. E cuidar da saúde, especialmente em comunidades tradicionais, exige respeito aos hábitos alimentares e às formas próprias de viver, cultivar e preparar os alimentos.


Neste Dia dos Povos Indígenas, celebrado em 19 de abril, é fundamental reconhecer que a luta pela soberania alimentar é também uma luta por visibilidade, autonomia e respeito às culturas originárias.



Em conversa com o CRN-3, Leonardo Silva, cacique da aldeia Guarani Tekoa Jejy-ty, localizada em Iguape (SP), compartilhou os caminhos e desafios da construção do Guia Alimentar para os Povos Guarani – uma publicação que nasceu da união entre o saber tradicional e a pesquisa acadêmica.

“Foi uma conquista desenvolver esse trabalho. Fomos a várias aldeias e até à Secretaria de Educação para apresentar o projeto. Mas quando a terra não é demarcada, tudo se torna mais difícil”, explica Leonardo.



A Tekoa Jejy-ty, assim como outras aldeias do Vale do Ribeira, enfrenta obstáculos para manter a produção de alimentos tradicionais. O projeto incentivou outras comunidades a desenvolverem iniciativas semelhantes, mas, a repressão em áreas não demarcadas, inclusive por parte da polícia ambiental, dificulta o cultivo de alimentos típicos, fundamentais para a saúde e para a cultura guarani.
 

 

"A alimentação tradicional é um saber que vem dos nossos ancestrais.
Quando deixamos de plantar e passamos a consumir
produtos industrializados, perdemos saúde e identidade.”

Leonardo Silva, cacique da aldeia 
Tekoa Jejy-ty

 

O projeto do Guia surgiu de uma parceria com a Unesp - Universidade Estadual Paulista, que promoveu rodas de conversa com a comunidade para discutir questões de saúde. Não demorou para perceberem que a alimentação tradicional e a soberania alimentar foram temas centrais, sobretudo pela preocupação com o consumo crescente de alimentos ultraprocessados entre as crianças.



Em Dourados, no Mato Grosso do Sul, um outro projeto com  pesquisadores e nutricionistas resultou em mudanças no cardápio da alimentação escolar indígena. Para Letícia Lopes de Souza, nutricionista indígena do povo Guarani,  entrevistadora de Campo da Fiocruz/MS e membro do Conselho de Alimentação Escolar - CAE/Dourados, a transição nutricional dentro das comunidades indígenas tem um efeito muito negativo, resultando em muitos casos de sobrepeso e obesidade, pois logo na primeira infância, são ofertados alimentos industrializados. Ainda de acordo com Letícia, que também participou do projeto em Dourados, é importante que haja uma conscientização coletiva. “Devemos nos conscientizar, reverter esse quadro, resgatando nossa cultura alimentar”, destaca a nutricionista. 


“A alimentação tradicional é um saber que vem dos nossos ancestrais. Quando deixamos de plantar e passamos a consumir produtos industrializados, perdemos saúde e identidade”, completa o cacique.



Durante o projeto do Guia Alimentar, os moradores da aldeia prepararam o solo, plantaram, colheram e, ao fim do processo, decidiram registrar todo esse conhecimento em um guia impresso. Lançado em 2023, o material teve tiragem limitada, e também está disponível em versão digital.

 

 

 

Todo dia é dia do povo indígena. Lutamos diariamente pela nossa cultura, nossa terra e nossa comida.

Cacique Leonardo Silva

 

A comunidade sonha agora com uma nova fase: ampliar a tiragem e traduzir o guia para o idioma guarani, de forma que mais pessoas e escolas possam acessá-lo. No entanto, esse novo passo depende de apoio financeiro, já que o projeto inicial foi concluído sem recursos para sua continuidade.



Para o CRN-3, é essencial destacar o papel do nutricionista nesse processo: apoiar essas comunidades na integração entre práticas nutricionais e saberes tradicionais, promovendo uma alimentação saudável, culturalmente adequada e socialmente justa. 



“A verdadeira troca de saberes se dá quando há escuta, respeito e reconhecimento dos modos próprios de cuidar e alimentar”, ressalta o cacique Leonardo. 

No fim da conversa, o cacique reforça que o Dia dos Povos Indígenas é, acima de tudo, uma data de reflexão. “É um dia triste para nós, porque lembra os massacres e a escravidão do nosso povo. Mas também é um dia de resistência. Por isso, todo dia é dia do povo indígena, porque lutamos diariamente para preservar nossa cultura e tradições.”


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